terça-feira, 29 de novembro de 2011

A rua dos Ipês





A rua dos Ipês
              Andrea Cristina Lopes


         Naquela tarde vestiu-se e fitou-se no espelho. Gostou de sua imagem refletida.  Era um vestido branco com estampas leves, discretamente perceptíveis, chamava atenção pelo corte que deixava sua silhueta discretamente exposta, porém, bem longe de tender para vulgar.

         Desde que se mudara para a nova casa e firmara-se na nova vida, mantinha o hábito de sair às tardes. Era uma moça de origem simples e em momento algum seu comportamento havia se modificado após a grande mudança.

          Na rua, percebeu que certos olhares se dirigiam mais vorazes a ela. No entanto, mantinha com elegância seu andar tranquilo, nada a incomodaria naquela tarde em especial.

          Vestiu as sandálias de tiras com salto cinco, estava apropriada para a tarde. Era verão, o calor bastante intenso. Prendeu parte dos cabelos, realçou o batom na tonalidade cetim, pressionou por uma única vez a válvula do perfume, fragrância de corpo floral com toques cítricos e rosa branca.

            Massageou as mãos com um creme umectante. Apanhou a bolsa, virou-se como quem confere se tudo está em ordem e dirigiu-se até a porta.

          Estava tudo certo. Cada coisa estava em seu devido lugar. Sobre a mesa de centro um pêndulo de orquídeas se derramava. Eram minúsculas flores amarelas com o labelo um pouco mais escurecido. Parecia-se com uma chuva, uma chuva dourada. Sorriu com os olhos.

          Fechou a porta atrás de si e caminhou até a rua por uma espécie de passarela que conduzia para fora daquele mundo particular. O jardim era gramado e naquela semana muitas flores haviam desabrochado. Todas saudáveis e frescas. Chuva! Uma garoa leve e constante havia percorrido a noite alegrando à vida.

           Caminhou alguns passos. Abriu a bolsa, ajeitou o pequeno livro de capa marrom e apanhou um pequeno cartão que após observar por algum tempo, acenou chamando o táxi.

           O carro seguiu pelas alamedas. O barulho era suave, quase imperceptível. Ela, em silêncio, observava a paisagem. Tudo era lindo. A cidade toda estava envolta naquele amarelo. Os ipês sorriam e a luz do sol se intensificava por entre os poucos vãos onde as flores não alcançavam.

         _ É aqui! - Falou ele, o gentil senhor que conduzia o veículo, interrompendo os pensamentos dela. Imediatamente pararam e ela saltou procurando identificar no lugar algo de seu passado.

          Por entre azaleias, foi avançando até chegar ao centro da praça. Ali avistou o velho assento em semicírculo. Os ipês estavam dispostos em fileiras beirando a rua, sob a qual se estendia um tapete, não um tapete vermelho de boas vindas, mas, sim um vasto pano amarelo. Um dourado que fazia parte da sua infância.

     A conveniência fez com que parasse e pensasse por certo tempo. Que sentimento era esse que a faria ir até esse lugar. Certamente não estava em sua razão perfeita, mas, foi assim mesmo.  Aproximou-se. Viu que algumas crianças brincavam descontraídas sem perceber sua aproximação. Era fascinante estar ali de volta depois de tanto tempo.

            Andou alguns passos e sorveu o aroma dos ipês que floriam. Era como se o tempo voltasse. Lembrou-se das palavras escritas no bilhete: “te esperaria por toda a vida, mas não demore, minha vida é esperar por você”.

           Pensou que cada dia que passava era um dia a menos. Um dia a menos que passaria ao lado dele. Caminhou mais alguns passos. Estremeceu ao olhar entre o pequeno muro e as flores. Seus pensamentos voltaram ao lugar no passado, onde crianças brincavam sem perceber o futuro que para ela estaria vindo, paradoxalmente ao passado. O presente predizia que novas emoções estavam adentrando seu dia.

            Ele lançou em direção a ela um olhar curioso. Como quem duvida da visão que tem. E ainda parecia o mesmo menino que brincava e fazia estripulias roubando-lhe as sandálias e um beijo. Ela tentava alcançá-lo, mas, sempre perdia a corrida, então chorava até que o pequeno traquina devolvesse seus calçados. A brincadeira de esconde-esconde recomeçava e as brigam eram esquecidas.

           Aquela rua era diferente. As flores dos ipês formavam um tapete macio e úmido sob seus pés. Ele sorriu para ela com o mesmo sorriso de antes: "– vou me casar com você, você vai ver se não caso". Dizia. Ela fingia que ficava zangada, mas no fundo torcia para que os anjos dissessem amém.

          À troca de olhares, sorriram-se mutuamente, como quem precisa de um momento só para reconhecer seu passado. Ele estendeu-lhe a mão. Ela fez menção de tocá-la, mas, num gesto espontâneo abaixou-se. Desamarrou as sandálias, segurou-as com uma das mãos e lhe ofereceu a outra. Caminharam. Passos curtos, desapressados sobre o tapete, ela tinha os pés nus.

          Falaram-se. Olharam-se e riram tão cúmplices, que tudo parou para observá-los.

          Já não consegui mais ouvir o que era dito. Talvez, fosse segredo aos meus ouvidos. Suas sombras seguiram ao seu lado. Traquinas, ora se escondiam entre as paredes do muro antigo, ora só iam, os quatro.

           Andaram até o final da rua, onde meu olhar não mais os alcançava. Vi seus corpos diminuindo na descida até sumirem completamente.

           Apenas o céu rosáceo permaneceu se unindo as flores dispostas sob a rua. Seu efeito nesse momento, observei que era de um amarelo murcho deitado na calçada. O entardecer estava desprovido de som. O tempo permaneceu imparcial. E continuou simplesmente, em total e absoluto silêncio.
         
                             


                                                                    *** imagens google***

domingo, 27 de novembro de 2011

Longos dias



Longos dias

Por Andrea Cristina Lopes

Por vezes penso que apenas fechei os olhos
e que logo mais
a igreja repicará insistentemente
o sino das horas,
que o tempo não se deu
e que já é tempo de a tempestade findar.

Que ao abrirem-se as janelas dos meus sonhos
sob o som estridente chamando para dia,
em respingos de luz na cortina,
verei tudo igual, como sempre quis,
como sempre sonhei pelo infinto
em que se deu a crença.

E a verdade será o amor
o domínio e a permanencia do amor brando
sem tolices... sem quimeras
e sobretudo sem nenhuma demora
porque essa, arrasa aos dias
e amedronta deveras quando é noite
se a luz se armazena
em horas, horas e horas a fio...
de uma sempre inútil
e inquietante espera.





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quarta-feira, 23 de novembro de 2011



Fim

Por Andrea Cristina Lopes


Esvanece-me tua última imagem
Secam-me os olhos
Não sangram mais e,
Meu peito também,
Já não me dói tanto.

Singraram-me para longe as lembranças
Os dias da primavera
As asas pelo céu
Só restou o silencio de estrelas
Noite adentro.

Mas, ´inda vaga-me de teus olhos
O doce do passado encanto
Por trilhas dilapidadas
Quando o dia, da noite frágil
Incomplacente descolore o manto.





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Da magia da canção



Da magia da canção



O cinza anoitece o azul
A noite se aprofunda macia
Estrelas faíscam em silêncio
Em olhos de canção, a magia.

E não há tempo algum de tristeza
Que habite teu coração
Se teus olhos cumplices de estrelas
Matizam a ternura e a beleza
Dessa partitura da imensidão.




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quinta-feira, 10 de novembro de 2011



Reticências
                  Por Andrea Cristina Lopes


Porque a tua presença
Flutua-me por sobre os olhos
Intermitentes
Insones
De infindáveis esperas

Sem tempo
Já não sou nada
Nem ninguém
Nem penso ser

A não ser por essas reticências
Que sempre se acabam por indagar
Nos simples versos
A que me atrevo
Ao te escrever



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Ontem



Ontem

            Por Andrea Cristina Lopes


Perpetuei-me na nuança da tua pele
Fiz-me então refém, sedenta e faminta dela
Um entardecer inteiro numa recém-pintura
Dessa minha inquietante sensibilidade
Ainda úmida a tinta, pelos dias finais, a tela.

Teus olhos, maciços amparos, me tragam
Os únicos que não distam e ainda me retém
E todos teus sonhos de um outrora recente
Pela força de um céu inteiro me fazem ´inda feliz
Afagam-me e, ainda em dias vindouros me têm.

Dos teus lábios sólidos sorvi tempestade inteira
Sabor e aroma de chuva polvilhada com canela
Um desejo candente, reticente, quase esparso
Só saudade infinita de sonhos que não pude ou fiz
E restam meus olhos à praça, pelo vão da janela.





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terça-feira, 8 de novembro de 2011

DOS AMORES IMORTAIS



Dos Amores Imortais

                                 Por Andrea Cristina Lopes



Não sei o quanto nasci
para esses amores imortais,
desmedidos e ditos
sem explicação.

Pois estes sempre
chegam e se/me vão
descuidados,
sem falsos cerimoniais.





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Estranheza



Estranheza

                         Por Andrea Cristina Lopes


E dessa estranheza
Em que me percebo
Determino condições
Para uma reação em cadeia.

O labor por minhas mãos
Ora produzidos
Desenvolvem-se por si só
Mecanicamente
Sem que o interfira
No plantio
Dessa minha ora não razão.

Meus passos, alheios
Vão sortidos e sem finalidade
Não esperam por nada
É apenas um absoluto estranhamento
Desse tempo não comum.

E nesse embalo
Onde falta-me uma metade
Já não respiro saudade alguma
Nem esperança alguma
Sou só e apenas um aparte
Entre os dias que ficaram para trás
E os que me esperam
Depois da noite.





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